Quando a propaganda vendia futuro em formato de cidade

O urbanismo como promessa de modernidade

Durante boa parte do século XX, a publicidade brasileira encontrou em um tema aparentemente técnico um dos maiores símbolos de progresso: a cidade. Projetos urbanos, conjuntos habitacionais, avenidas monumentais e bairros planejados foram alvos de campanhas que vendiam mais do que imóveis ou infraestrutura — prometiam um futuro moderno, civilizado e eficiente.

Inspirada por modelos norte-americanos e europeus, a publicidade urbana no Brasil incorporou uma linguagem otimista, tecnológica e, muitas vezes, utópica. Elementos como o automóvel, o arranha-céu, os jardins geométricos e a ausência de favelas apareciam como ícones de um país que queria — ou fingia querer — se reinventar do zero. Esse imaginário foi amplamente usado por construtoras, governos e empresas de transporte para conquistar a opinião pública.

O Brasil projetado nos outdoors

Na década de 1950, o boom desenvolvimentista impulsionado pelo governo de Juscelino Kubitschek promoveu um verdadeiro surto de campanhas voltadas para o “Brasil do futuro”. Brasília, claro, foi o maior símbolo dessa virada. O plano piloto de Lúcio Costa e os traços de Niemeyer foram celebrados em anúncios que mais pareciam cartazes de ficção científica. A propaganda da nova capital vendia silêncio, organização e horizontes amplos como se fossem bens de consumo.

Ao mesmo tempo, cidades como São Paulo e Belo Horizonte viam crescer a publicidade de loteamentos periféricos, sempre com slogans que misturavam natureza, conforto e segurança. Era comum encontrar anúncios com frases como “sua casa em um bairro-jardim” ou “qualidade de vida a 20 minutos do centro”, acompanhados de maquetes coloridas e famílias sorridentes. Mesmo quando a realidade não condizia com a promessa, o poder da imagem se mantinha intacto.

O papel da televisão na urbanização idealizada

Com o advento da televisão nos anos 1960, a propaganda urbana ganhou nova potência. Comerciais de empreendimentos imobiliários tornaram-se comuns, com narrações épicas, trilhas sonoras triunfantes e panorâmicas aéreas dos canteiros de obras. A cidade ideal deixava de ser um plano e virava espetáculo.

Esses comerciais reforçavam a ideia de que a conquista de um imóvel — especialmente em condomínios fechados ou edifícios verticais — era o ápice da ascensão social. A casa própria passou a ser sinônimo não apenas de estabilidade financeira, mas de pertencimento ao Brasil moderno. Campanhas do BNH (Banco Nacional da Habitação) e de grandes construtoras reforçavam esse discurso com frases como “mude sua vida, mude seu CEP”.

Um imaginário que ultrapassa o concreto

Mesmo fora do setor imobiliário, a ideia de cidade idealizada continuou servindo como pano de fundo para produtos diversos: carros que prometiam liberdade nas novas avenidas, eletrodomésticos que combinavam com a “casa moderna”, planos de saúde voltados para o morador do “bairro modelo”. A publicidade adotou a estética do planejamento urbano como forma de transmitir ordem, progresso e futuro.

Curiosamente, essa lógica segue influente até hoje, inclusive em ambientes digitais. O site https://monopolybigballer.com.br/, por exemplo, se apropria de elementos visuais inspirados na lógica das grandes cidades planejadas: quadrantes bem definidos, tipografia simétrica e um visual que remete à organização cartográfica. É um reflexo de como o simbolismo urbano ainda comunica segurança e estratégia mesmo fora da paisagem física.

As ruínas do que foi vendido

Com o tempo, a distância entre o sonho publicitário e a realidade urbana se tornou mais evidente. Muitos dos bairros planejados envelheceram mal, os conjuntos habitacionais se deterioraram, e a mobilidade urbana prometida nunca se concretizou plenamente. A propaganda, no entanto, raramente acompanhou esse colapso simbólico. Preferiu reinventar novas utopias — como os “condomínios-clube”, os “resorts residenciais” e, mais recentemente, os “bairros inteligentes”.

Ainda assim, para quem estuda a história da propaganda no Brasil, os anúncios urbanos do século XX revelam muito mais do que estratégias de marketing. Eles denunciam a forma como o país pensava o futuro — e quem seria incluído ou excluído dele.

A cidade, transformada em produto pela publicidade, foi uma das maiores metáforas do progresso brasileiro. Hoje, ela continua sendo palco de disputas simbólicas, mesmo quando representada em pixels ou slogans. Afinal, vender uma cidade sempre foi, antes de tudo, vender uma ideia de país.

Nenhum comentário